A base da educação brasileira: os professores

Entenda o papel dos professores no incentivo e cuidado com os jovens

Aqui no Semear nós buscamos abordar o ensino e a permanência estudantil de diferentes formas. Seja com auxílios para promover a não evasão universitária ou com incentivos e distribuição de informação gratuitamente para alunos do ensino médio, buscamos ajudar na criação de uma educação mais justa. Dessa forma, caminhamos lado a lado com as pessoas que mais trabalham no desenvolvimento e incentivo dos jovens, e que são destaque no mês de outubro: os professores.

Convidamos a Profa. Dra. Camila Beltrão Medina, coordenadora e docente do Curso de Pedagogia na Universidade do Vale do Paraíba – UNIVAP, para comentar sobre os desafios e felicidades da sala de aula.

Instituto Semear: Qual o seu nome e experiência profissional?

Camila Medina: Meu nome é Camila Medina, faz mais de 20 anos que eu ensino e trabalho com formação de professores, essencialmente nas licenciaturas. Esse é o percurso que me faz brilhar, eu gosto de dar aula. Também tive cargos de gestão, mas o que me fascina é a docência, é a sala de aula.

Fiz o Magistério no Ensino Médio, que é como um curso técnico para professores, e no final me apaixonei e me encantei com a docência, tanto que quando fui prestar o vestibular, escolhi o curso de Pedagogia. Assim, continuei na área da educação e me formei em pedagogia na Unesp de Araraquara. Depois o meu caminho me levou a fazer o mestrado em educação na Universidade Federal de São Carlos e mais tarde, fiz o doutorado em educação na USP. Eu já estava trabalhando, tendo minha vida, filhos, mas senti que queria ter a graduação de Psicologia, cismei e concluí a graduação em Psicologia agora em Julho. Então minha vida profissional inteira foi voltada para educação. 

Gosto muito da sala de aula e acredito que o caminho de emancipação das pessoas é a educação. Não necessariamente a educação formal ou escolar, mas o saber, o aprender. É isso que vai emancipar, empoderar, porque quando você tem conhecimento, se sente valorizado, empoderado e esse sentimento de empoderamento, de pertencer à comunidade, é que vai levar autonomia e emancipação às pessoas e então a felicidade. E acho que na nossa existência, eu não vejo outro sentido para estarmos aqui se não é para sermos felizes. Então quando você está fazendo alguma coisa que se sente pertencente, se sente realizado, se sente valorizado, você é feliz.

Na frente da imagem há uma foto recortada da professora Camila Medina sorrindo. A foto está em branco e preto e contornada de amarelo. Ao fundo há uma foto de um prédio com a placa "UNESP" na frente

Instituto Semear: Quais são para você os maiores desafios da educação brasileira?

Camila Medina: Acho que um dos grandes desafios, talvez o maior, sejam as desigualdades sociais, que refletem no campo educacional. É uma luta enorme para que a gente tenha uma educação de boa qualidade para toda a população e temos historicamente uma dicotomia no processo formal de ensino.

Então existem dois modelos educacionais, dois modelos pedagógicos, um para uma determinada parte da população e outro para um outro grupo da população que é menos provido de recursos econômicos.

Com isso, as pessoas das classes sociais mais altas têm a educação e a escola como um elemento a mais em suas vidas. Eles vão para escola, mas eles vão para o museu, viajam, vão ao cinema. E as pessoas das classes sociais mais baixas tem como meio de conhecimento quase único a escola.

Então essa diferença de ensino, de oportunidades e de possibilidades, é um grande agravante e não há uma solução fácil.

Também tem toda uma questão econômica e de investimento na educação, precisamos que ela seja entendida não como gasto, mas como um investimento do setor público, destinando condições para que essas escolas consigam melhorar sua formação de professores e a qualidade da estrutura física. 

A foto mostra diversos jovens em uma sala de aula azul, todos estão sentados em cadeiras beges e olhando para o professor que não aparece na foto.

Instituto Semear: Qual o papel dos professores na educação na mediação de alguns desses desafios?

Camila Medina: Eu acho que antes de mais nada, tem que ser feito com o professor um exercício de empoderamento, isso que vocês fazem no Semear com os jovens? A profissão de docente é uma profissão socialmente desvalorizada. Quando falam “Vou fazer pedagogia”, logo vem “Mas você é tão inteligente, vai fazer pedagogia?”, ou então, “Mas você vai trabalhar com o que? Você vai morrer de fome”.

Historicamente, a gente precisa ter esse percurso de que era uma profissão que foi autorizada para as mulheres. Então elas não podiam trabalhar, tinham que casar e virar donas de casa, principalmente as de classe social alta. Claro que as mulheres de classe social baixa não, essas trabalhavam nas fábricas e não seriam professoras porque elas não teriam passado pelo processo formal de ensino. 

Quem então exercia a profissão docente eram jovens que tinham por volta dos 18, 19 e 20 anos, que tinham o pai fazendeiro. Com isso elas faziam a escola normal na capital para poder estudar, ter esse conhecimento e formação, voltavam de lá para as fazendas e alfabetizavam as pessoas ali perto até casarem.

Essa não é uma pessoa que precisava de um grande salário, de grandes condições de trabalho. Então a feminização do magistério foi sendo um elemento que foi tornando essa profissão com a remuneração mais baixa e portanto socialmente num sistema capitalista, é marginalizada. 

Por isso esse professor não se empodera, não se sente forte e poderoso. “Eu sei, eu conheço e domino isso que faço”. “Eu sou bom no que faço”. Ele próprio se subjuga muito, então a primeira coisa é ele se empoderar, “Eu sei o que eu tô fazendo, eu tive uma boa formação, eu estudo, eu procuro”. Se ele tem esse empoderamento, o que vai acontecer é que o professor vai desenvolver um trabalho na sua sala de aula com muito mais afinco, vontade, com uma qualidade muito maior.

E ele também vai buscar uma melhor condição da sua qualidade de trabalho, porque não é só salário, é qualidade de trabalho, é segurança no ambiente de trabalho, é poder ir trabalhar e se sentir seguro se sentir valorizado.

 

Elas chegam na faculdade sem confiança, mas você vai dando aula, vai falando da educação, vai falando da pedagogia e você vai ver aquela pessoa se transformar. Porque é uma autovalorização, ela se sente mais valorizada, importante, então ela vai demonstrar nela, que agora ela sabe, ela é uma professora.

Camila Medina



Instituto Semear: Como você, sendo alguém que atua nessa preparação de novos profissionais da educação, dá foco ao cuidado com os alunos?

Camila Medina: Eu sou docente e coordenadora do curso de pedagogia. Então eu tenho uma aproximação com os estudantes todos por nome. Eu sei não da vida inteira, mas sei de eventos das vidas, sempre tem alguém que vem até mim.

Você vai se aproximando dos estudantes, acho que a gente não pode perder isso de vista. Nós estamos aqui, o foco é a formação, é o conteúdo e eu procuro empoderar as minhas alunas. Eu respeito meus alunos, tenho consideração quando vou preparar uma aula, tenho que preparar minha aula e vou chegar preparada, isso é sinal de respeito? Eu vou ler um material atual. “Nossa saiu esse artigo sobre esse tema? Vamos discutir? Vamos trabalhar?”. 

Vou com slide preparado antes da aula, já disponibilizo com antecedência no portal o material. Com tudo isso você mostra que os considera, eu acho que isso é importante nesse processo de formação de professores.

Instituto Semear: Quais têm sido os resultados e há alguma história ou relato que você queira compartilhar?

Camila Medina: É um caminho que você vai percorrendo e que vai devagarzinho, buscando alcançar, então sem dúvida nenhuma alguns dos meus alunos que passaram por mim não seguiram a carreira docente, optaram por outras coisas na vida. Mas eu tenho a percepção que muitos dos estudantes que eu tive a oportunidade de lecionar estão trabalhando na educação e estão bem.

Na semana passada, a prefeitura de São José fez um congresso de capacitação para os seus professores e um professor oportunizou que as alunas fossem para lá, então nós fomos. E há dois lados, ali tinham muitas das pessoas que foram meus alunos, mas agora como professores da prefeitura, dando aula ou trabalhando na Secretaria da Educação. Isso é sucesso, é um resultado positivo de formação. 

E do outro lado as minhas estudantes de hoje que foram fazer as oficinas, participaram das palestras e que elas foram muito elogiadas em relação ao comportamento, as colocações que elas fizeram, as perguntas, a participação. Lá elas se sentiram confiantes de estarem ali, se posicionando e falando, isso também me confortou e me mostrou que acho que eu estou no caminho.

Às vezes vêm pessoas mais velhas para a graduação, já fora do percurso mais comum de formação. Elas chegam na faculdade sem confiança, mas você vai dando aula, vai falando da educação, vai falando da pedagogia e você vai ver aquela pessoa se transformar. Porque é uma autovalorização, ela se sente mais valorizada, importante, então ela vai demonstrar nela, que agora ela sabe, ela é uma professora.

Instituto Semear: Como para você os professores afetam, ou incentivam a mudança no futuro dos alunos?

Camila Medina: Diretamente! O papel do professor é direto.

Quando as crianças vão entrar na escola formal há um movimento de transferir o sentimento de apego, de proteção e cuidado dos pais para o professor. Então o professor é aquele que protege, que ensina, orienta e se firma um elo muito forte entre esses alunos. É por isso que a falta desse cuidado pela família pode gerar diversas questões em uma criança, e essas questões irão se repetir no vínculo pedagógico, então se você tem um aluno que confia em você que cria um vínculo, um elo, você mostra respeito e consideração.

A partir de um professor que está ali para ser professor, não só saber o conteúdo, mas saber se relacionar, conseguir perceber as fragilidades dos estudantes, que não os desacredita, não diminui um estudante em nenhuma situação ou hipótese, aí sem dúvida nenhuma ele é o canal é para poder motivar os estudantes a não quererem parar de aprender, seguindo a carreira Universitária ou na vida. Nem todo mundo faz Universidade, mas aprender você não pode parar nunca!

Eu entendo que para o jovem, que se encontra numa profissão se encontra num curso, tem prazer de ir para aula, quer tá ali, quer aprender, quer ler mais sobre aquilo, procura na internet uma pessoa que fale sobre o assunto. Ele está vendo na escola, na faculdade, isso que é a essência da aprendizagem, da educação. Isso me move, isso me fascina.

Em foco na foto está a professora Camila Medina, uma mulher branca de cabelos castanhos na altura dos ombros sorrindo para a câmera. Ela usa camiseta e calça pretas e está em frente a mesa da professora. A foto mostra ao fundo uma sala de aula vazia, com mesas e cadeiras beges e uma janela grande ao fundo.

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